John Langshaw Austin e o mais onipresente dos fenômenos sociais: a fala
John
Austin (1911–1960), filósofo britânico e expoente da filosofia da linguagem,
revolucionou o entendimento da comunicação ao desenvolver a teoria dos atos de
fala em sua obra How to Do Things with Words (1962). Austin criticou a visão
tradicional de que a linguagem serve apenas para “descrever fatos”, propondo que
enunciados são ações realizadas através da fala.
Sua teoria enfatizou o
papel pragmático da linguagem, influenciando campos como a linguística e as
ciências sociais ao mostrar como a fala constrói realidades e interações
sociais.
Mas quando exatamente o falar é agir e o que a pragmática tem a ver com
isso?
Dificilmente pensamos sobre o impacto real das palavras que usamos no dia
a dia. Contudo, observando situações simples da vida cotidiana, podemos
identificar que nem sempre falar é apenas comunicar uma ideia; em muitos casos,
falar é agir. Imagine um casamento: quando o juiz ou celebrante diz "Eu vos
declaro marido e mulher", ele não está apenas informando algo, mas criando um
novo estado civil, uma mudança na realidade.
Trazendo isso para uma
linguagem cotidiana, quando sua mãe solta um "Num te disse?", ela não está
apenas relembrando um aviso, mas reforçando sua autoridade sobre o que foi dito.
Quando um amigo ou amiga diz "Confia!" ou “Cola em mim que é sucesso!”, não é só
incentivo, é um pacto de confiança e uma instrução para que o outro siga
orientações ou imite determinado comportamento. Esses são exemplos que
demonstram como a pragmática está presente no nosso dia a dia por meio do nosso
discurso, visto que esse ramo da linguística se trata do estudo do significado em
uso, ou seja, de como a linguagem é utilizada na comunicação real.
Em outras
palavras…
Diferente da semântica, que foca no significado das palavras e frases
isoladas, a pragmática se preocupa com a interação e as implicações do que é
dito. Afinal, uma simples frase como "Pode me passar o sal?", esse “pode” não é
uma pergunta sobre capacidade física, mas um pedido educado em um almoço ou
jantar. Para ser regionalista, no Piauí, quando alguém diz "Ó o
mei!", não está apenas sugerindo a observação de algo, mas ordenando diretamente que
você saia do caminho.
A teoria dos atos de fala John Austin (1962), um dos
principais nomes na pragmática, revolucionou os estudos da linguagem ao perceber
que muitas expressões não descrevem o mundo, mas realizam ações. No livro How to
Do Things with Words (1962) ou Quando dizer é fazer, em uma tradução de Danilo
Marcondes de Souza Filho (1990) , o autor introduziu a distinção entre
enunciados constativos e performativos. Enquanto os primeiros apenas descrevem
uma realidade ("O céu está azul"), os segundos realizam uma ação ao serem ditos
("Eu prometo", "Eu aposto", "Eu te batizo").
Austin (1975) teve sua teoria
revisada, onde são identificados três tipos de atos de fala:
- Atos locucionários: correspondem ao ato de dizer algo com estrutura e significado. Exemplo: "Você está despedido".
- Atos ilocucionários: referem-se à intenção do falante ao dizer algo, como ordenar, prometer, ameaçar ou perguntar. No exemplo acima, o falante não está apenas informando, mas efetivamente demitindo alguém.
- Atos perlocucionários: dizem respeito ao efeito causado no ouvinte. A frase "Você está despedido" pode levar ao choque, tristeza ou à necessidade imediata de procurar um novo emprego.
Fonte: Instagram - @tirinhasinteligentes
John Searle (1980), aluno de Austin, expandiu essa
teoria, classificando os atos ilocucionários em cinco categorias principais:
- assertivos;
- diretivos;
- compromissivos;
- expressivos;
- declarativos.
Etsuko Oishi
(2006) complementa essa discussão ao destacar que os atos de fala não acontecem
isoladamente; eles dependem do contexto comunicativo e das relações entre
falantes e ouvintes. Assim, um pedido pode ser interpretado como uma ordem,
dependendo da relação hierárquica entre os interlocutores.
Como os atos de fala
impactam nossa comunicação?
Seja no ambiente profissional, seja nas redes
sociais ou em interações cotidianas, nossos atos de fala moldam nossas relações.
Um "eu prometo" cria uma obrigação, enquanto um "parabéns" manifesta
reconhecimento. Mas o que acontece quando as palavras não correspondem à
intenção real? Pense em uma expressão bem piauiense: "Um rum!". Dependendo do
tom, pode ser um simples assentimento ou um claro sinal de ironia. E quando um
amigo diz "Vaza!", com impaciência, ele está realizando um ato diretivo,
ordenando que você dê espaço ou retire-se. Essas nuances mostram como o contexto
é essencial para que um ato de fala seja bem-sucedido.
Como destaca Fiorin e
Discini (2013), a pragmática revela que a linguagem não é apenas um veículo
neutro de informação, mas um instrumento de ação social. Ou seja, é preciso
entender não apenas o que se fala, mas como, onde e por quem é falado. Portanto,
da próxima vez que você disser algo, pense: suas palavras estão apenas
informando ou estão mudando o mundo ao seu redor?
REFERÊNCIAS
AUSTIN, John L.
How to do things with words. 2. ed. Cambridge: Harvard University Press, 1975.
AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer: palavras em ação. Tradução: Danilo
Marcondes de Souza Filho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
FIORIN, José Luiz;
DISCINI, Norma. O uso linguístico: a pragmática e o discurso. In: FIORIN, José
Luiz (org.). Linguística? Que é isso?. São Paulo: Contexto, 2013. cap. 6, p.
181-203.
SEARLE, John R.; KIEFER, Ferenc; BIERWISCH, Manfred (Eds.). Speech Act
Theory and Pragmatics. Springer Netherlands, 1980.
Priscila, sinto falta de exemplos dos 3 atos de fala. Referencia: sinto falta do Etsuko Oishi (2006).
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