Como compreendemos as mensagens na mídia? Um olhar sobre a Teoria da Recepção de Stuart Hall

            


Stuart Hall


Fonte: https://saraus.com.br/stuart-hall.html


           Vivemos em um mundo onde nos deparamos diariamente com mensagens nas redes sociais, na televisão, nos jornais e nas conversas do dia a dia. Mas será que todos entendemos essas mensagens da mesma forma? Stuart Hall, um importante teórico da comunicação, acreditava que a resposta era “não”. Para ele, a audiência não é passiva; pelo contrário, ela interpreta, questiona e até ressignifica o que recebe. Com base na sua Teoria da Recepção, podemos entender melhor como a comunicação funciona em camadas e por que diferentes pessoas podem reagir de formas completamente distintas à mesma mensagem. A imagem a seguir nos traz um exemplo recente. 



Fonte: @desenhosdonando (compilado pela autora)


            Na postagem, a charge denuncia um caso recente de homofobia protagonizado por uma mulher, que, mesmo após ter sido presa por crime de homofobia, foi solta em pouco tempo e logo voltou a cometer o mesmo crime, agora contra seus vizinhos. O contraste entre a repetição da violência e a tentativa (aparentemente frustrada) por parte das vítimas de conter seus efeitos evidencia nos comentários da postagem uma percepção de impunidade e seletividade do sistema judiciário.

          Conteúdos como este mobilizam o que Stuart Hall chamaria de posição oposicional na recepção de mensagens midiáticas: o público não só recusa o conteúdo de ódio, como também rejeita a narrativa dominante de que "a justiça está sendo feita". Os comentários — como “O privilégio branco...”, “A certeza da impunidade...” e “#JudiciárioSeletivo” — demonstram uma interpretação crítica que recodifica o sentido da notícia, revelando indignação diante de um sistema que falha em proteger as vítimas e punir de forma justa os agressores.

        Dito isto, o objetivo desta postagem é apresentar a perspectiva de Hall sobre os estágios do processo de comunicação e as três diferentes posições (incluindo a oposicional mencionada acima) que um indivíduo pode tomar ao decodificar uma mensagem televisiva, trazendo sua teoria para uma perspectiva atual que inclui as mídias sociais.

Teoria da Recepção

         Hall desenvolveu o modelo de comunicação que codifica e decodifica:

  • A linguagem e a mídia não refletem a realidade, mas simplesmente constroem algo semelhante à nossa ideologia" — (Hall, 1980)
  • Com a teoria de Hall, foi possível que a audiência mudasse o significado de uma mensagem para que se adequasse ao seu contexto social.
  • ➝ "As ideologias do receptor serão ou dominantes, negociadas ou oposicionais."
  • ➝ Hall focou na decodificação (algo novo)
  • ➝ "Nunca é apenas uma mensagem recebida. Como resultado, a audiência precisa adicionar significado e reconstruir ou recriar a mensagem." (Hall, 1983)

Os quatro estágios no processo de comunicação de Hall

1. Produção
        ➝ A mensagem é codificada por quem a cria
         
        Hall explica que, nesse momento, o significado é estruturado com base em valores, ideologias e intenções do emissor, que organiza signos e símbolos de forma a gerar um efeito desejado. No entanto, ele ressalta que a mensagem não garante ser entendida exatamente como foi pensada, pois o sentido final também depende da recepção.

2. Circulação
        ➝ Determina o sucesso dos próximos estágios.
        ➝ O envio e a entrega têm influência sobre a ação ou resposta da audiência.
        ➝ Parcialmente responsável pela reação da audiência.
3. Uso
        ➝ Indica que a audiência deve fazer algo com a mensagem
        ➝ O público se apropria da mensagem e decide o que fazer com ela.
        
        Hall entende a comunicação como um processo ativo, no qual os receptores não são meros consumidores passivos, mas sujeitos que atribuem sentidos e interagem com o conteúdo recebido. O estágio de uso, portanto, marca a instância em que a audiência interpreta, negocia e articula a mensagem a partir de sua própria vivência, valores e contexto social.

4. Reprodução
         ➝ Resposta ou reação
         
         Para Hall, é o estágio em que as pessoas saem e fazem algo com a mensagem.

Três diferentes posições que se pode assumir ao decodificar uma mensagem televisiva: 


A. Dominante
            ➝ A produção ou mensagem do autor é transmitida com sucesso.
            ➝ O leitor possui um pensamento dominante, interagindo, aceitando e compreendendo a mensagem pretendida.
            
            Nessa posição, o receptor aceita a mensagem conforme foi codificada pelo emissor. Há uma identificação ideológica com o conteúdo e seus valores. O público compartilha da mesma visão de mundo de quem produziu a mensagem e, por isso, interpreta, entende e concorda com ela da maneira pretendida.

B. Negociada
            ➝ A audiência reage com uma mistura de aceitação e rejeição.
            ➝ A audiência mantém sua própria interpretação e pontos de vista sobre partes da mensagem ou cria seus próprios subtextos e cenários.
            
            Aqui, o receptor concorda parcialmente com a mensagem, mas adapta ou rejeita certos aspectos com base em sua experiência pessoal ou contexto social. Essa posição revela um tipo de recepção crítica, na qual a audiência negocia o sentido da mensagem: aceita alguns pontos, mas contesta ou ressignifica outros.

C. Oposicional
            ➝ A audiência rejeita completamente a mensagem transmitida.
            ➝ Eles mudam e adicionam seu próprio significado à mensagem
            ➝ Oposto ao pensamento dominante e do emissor ou visível.

            Na posição oposicional, o receptor rejeita completamente a mensagem e seus valores implícitos. Em vez de aceitar ou adaptar o conteúdo, a audiência interpreta o discurso a partir de uma perspectiva contrária, muitas vezes invertendo seu significado original. Essa leitura é crítica e subversiva, mostrando como o público pode resistir ideologicamente ao conteúdo transmitido.


            Para concluir, podemos dizer que a teoria da recepção proposta por Stuart Hall (1980 apud Davis, 2004) nos convida a compreender a comunicação como um processo ativo e ideologicamente carregado, no qual o sentido não é simplesmente transmitido, mas negociado ou contestado pela audiência. Ao descrever as posições dominante, negociada e oposicional, o autor evidencia que os receptores são sujeitos críticos que interpretam as mensagens de acordo com seus contextos sociais, culturais e políticos. Esse modelo rompe com a ideia tradicional de comunicação linear e destaca o papel essencial da audiência na construção de significados. 


REFERÊNCIAS

HALL, Stuart. Encoding and decoding in the television discourse. Discussion Paper. University of Birmingham, Birmingham. p. 1-19, 1973. Disponível em: http://epapers.bham.ac.uk/2962/. Acesso em: 16 de junho de 2025.

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

John Langshaw Austin e o mais onipresente dos fenômenos sociais: a fala